UA estuda robôs que escolhem e classificam peças colocadas ao acaso. “Bin Picking” pode significar vantagem competitiva para a indústria.

2015-03-11 12:12

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Para quem desconhece os meandros da robótica, identificar, apanhar e classificar mecanicamente peças que são colocadas ao acaso numa superfície é algo de banal. Nada mais errado. Designado “Bin Picking”, o problema é complexo e pode ter grande impacto na indústria, dado que a automatização destes processos torna as empresas mais competitivas. O Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Aveiro (UA) estuda essas soluções. Recentemente, foi apresentada uma dissertação de mestrado nessa área e surgiu uma empresa dedicada à visão artificial na Incubadora de Empresas da UA.

O problema de automatismo no chamado “Bin Picking” - “bin”, termo inglês para caixote/contentor, e “picking”, acto de apanhar - começa na identificação das peças num conjunto disposto ao acaso, explica Vítor Santos, professor do Departamento de Engenharia Mecânica da UA e investigador do Grupo de Robótica do Instituto de Engenharia Eletrónica e Telemática de Aveiro (IEETA).

A visão artificial, aspeto central no “Bin Picking”, preferencialmente a três dimensões, deve reconhecer peças diferentes de um conjunto. O reconhecimento é tanto mais difícil quanto mais complexa for a forma das peças e a forma delas diferir entre si. Há formas planas, como bolachas (no caso da indústria alimentar), volumes regulares – como porcas ou parafusos, na indústria metalomecânica - e outros côncavos, como copos, agravando a dificuldade na perceção da forma.

No passo seguinte será necessário apanhar as peças, encontrando um ponto de fixação e usando os dispositivos de captura adequados à superfície e ao tipo de peças: ventosa, pinça a abrir para fora ou para dentro, entre outras. O robô deverá ainda ser capaz de classificar as peças e separá-las com uma certa ordem e colocá-las, por exemplo, em contentores de acordo com o tipo de cada peça.

Sendo uma questão de enorme importância para a indústria, só em alguns casos essas soluções de robótica estão em funcionamento, dada a sua complexidade e custo, porque cada caso é um caso. Realizada através de meios humanos, situação comum, este tipo de tarefas desgastantes e repetitivas pode originar, com frequência, doenças profissionais, tornando-se por isso ainda mais dispendiosa.

Assim, Vítor Santos identifica três tarefas fundamentais no “Bin Picking”: perceção avançada que pressupõe visão artificial e processamento da informação (forma das peças, localização no espaço e classificação); manipulação e interação com humanos. O termo “Bin Picking” nasceu na indústria que identificou o problema. Hoje, esclarece o investigador, a interação com as pessoas e a manipulação mecânica dos objetos estão relativamente avançados. Mas residem problemas na deteção.

No Departamento de Engenharia Mecânica, decorreram trabalhos académicos que aplicaram estes conceitos. A dissertação "Bin Picking de Objetos Polimórficos Convexos usando Perceção 3D" foi apresentada por Nuno Santos, em dezembro de 2014, no âmbito do Mestrado Integrado em Engenharia Mecânica, com orientação de Abílio Borges e Vítor Santos. A solução apresentada usou visão 3D para detetar e separar cilindros, cubos ou paralelepípedos. “Esta aplicação é útil em indústrias que necessitem de separar objetos em ambientes não controlados”, explica Nuno Santos. “O Bin Picking é utilizado nos mais diversos tipos de indústria, desde a farmacêutica à automóvel; permite automatizar processos, o que torna as empresas mais competitivas. As empresas que produzem em larga escala têm no Bin Picking uma forma de acelerar os seus processos de produção”, refere o recém-diplomado, agora a trabalhar em projeto mecânico numa empresa da região.

Uma outra dissertação de mestrado, defendida por Luís Rodrigues, propunha uma solução de “Bin Picking” para pneus, usando visão a duas dimensões e um sensor rudimentar para medir a profundidade.

Recentemente, surgiu uma start up na Incubadora de Empresas da UA (IEUA) que se dedica à visão artificial e tem interesses neste campo. A empresa designa-se VisionMaker e um dos fundadores é antigo aluno da UA, de Engenharia Eletrónica e Telecomunicações, com formação posterior em Engenharia de Automação Industrial. Hugo Nogueira explica que a empresa que fundou está muito interessada em parcerias com grupos da UA que têm provas dadas na investigação em “Bin Picking”, visão e noutras áreas da robótica aplicada.

Este antigo aluno de Engenharia Eletrónica e Telecomunicações da UA e também ex-aluno do Departamento de Engenharia Mecânica, considera que o “Bin Picking” pode muito bem vir a ser um boost industrial, um impulso para a indústria.

A aplicação industrial, contudo, “é apenas a ponta do iceberg”, uma das várias aplicações deste tipo de soluções, defende Vítor Santos num texto sobre esta área, publicado na revista “Robótica” n.º 83 em Julho de 2011.

Outra aplicação possível é na robótica de uso doméstico. Imagine que está sentado na sala, chama um assistente robotizado, pede-lhe uma cerveja que está no frigorífico e, passados minutos, a cerveja está na sua mão... E nem foi preciso sair do sofá!…

Texto: UA